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terça-feira, 29 de junho de 2010

Nova hermenêutica da expressão "Sempre que Possível": Uma crítica doutrinária.




Virgo Vênus Gomes ( * )

A Constituição Federal de 1988 consagra o princípio da capacidade contributiva. Espeque o art. 145, § 1°: "Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte [...]". Contudo, a expressão sempre que possível segundo Hugo de Brito Machado deverá ser interpretada com ressalvas, pois tal expressão está relacionada com o caráter pessoal dos tributos, porém nem todos terão, tecnicamente, o caráter pessoal.

Por esta teoria dois patrimônios, sujeitos aos impostos reais, sofreriam a mesma tributação, sendo irrelevante a capacidade contributiva do agente passivo. Data vênia, esta não é a melhor posição, fraqueja o pensamento do renomado autor, por incompatibilidade com o princípio da solidariedade fiscal, que traz consigo toda carga de elementos constitutivos dos tributos, não só a simples ocorrência do fato gerador. Porque quem pode pagar mais, pagará mais de acordo com a sua capacidade econômica. Além do mais, entender o termo "sempre que possível" como quer Hugo de Brito Machado é interpretar o art. 145, § 1°, CF, utilizando a pior hermenêutica de compreensão da norma: a literal. Tornando assim, o dispositivo meramente programático, cujo alto grau de abstração poderia propiciar interpretações incompatíveis com os ditames do Estado Democrático de Direito, pois que, se por um lado a simplicidade da hermenêutica literal propicia segurança, por outro, a alta abstração propiciada na valoração das normas ditas programáticas podem igualmente conduzir a equívocos, motivo pelo qual deve a interpretação sempre guiar-se pelo valor supraprincipiológico(1) constitucional, sob pena de não se alcançar sua máxima aplicação (quando ponderado seu caráter teleológico).

Ademais, o legislador tem a obrigação de elaborar leis justas, principalmente as de caráter tributário, face sua natureza expropriatória(2).

A melhor doutrina não aceita a assertiva de que os impostos reais devam assentar sobre a materialidade das coisas, com abstração total da pessoa do contribuinte. É inconcebível, por exemplo, que um pequeno agricultor tenha as suas terras a mesma carga tributária dos impostos territoriais de um grande latifundiário, simplesmente, porque possuem o mesmo valor venal. E a fundamentação de todo esse pensamento é bastante singelo, pois em última analise o contribuinte desfalcado do essencial acabará engrossando as filas dos necessitados da assistência a cargo do Estado, onerando desnecessariamente os cofres públicos.

Em conclusão podemos dizer que a expressão "sempre que possível" dever-se-ia relacionar com a capacidade contributiva do agente passivo; e não com o caráter pessoal do tributo. A melhor construção seria: "O contribuinte deverá pagar os seus impostos, contribuindo com as despesas do Estado 'sempre que possível'."


Referências:

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.


Notas:

* Virgo Vênus Gomes é Advogado e pós-graduando em Direito Público. 

1 - Expressão comumente utilizada por Flávia Piovesan para indicar valores maiores ligados aos princípios como dignidade da pessoa humana e que terminam por sobrepor-se a todos os demais valores, daí a expressão "supra". 

2 - No sentido de retirar o patrimônio do contribuinte, com finalidade arrecadatória, contudo sem caráter confiscatório. 

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