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terça-feira, 31 de agosto de 2010

Bar que promoveu ruído após o horário permitido vai indenizar casal em 32 mil

Sentença Cível

Fonte | TJDFT - Segunda Feira, 09 de Agosto de 2010



Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT

Circunscrição: TAGUATINGA
Processo: 2008.07.1.029124-6
Vara: SEGUNDA VARA CÍVEL DE TAGUATINGA


SENTENÇA

Célio Martins Saminêz e Marinete Villar Busto ajuizaram ação contra Adalberto Barbosa Marques Veras - ME e Adalberto Barbosa Marques Veras relatando terem adquirido e residirem, juntamente com os dois filhos menores, no imóvel situado na C01, lote 11, apt. 204, Setor Central - Av. das Palmeiras, Taguatinga-DF, que faz parte de edifício multifuncional, composto por 48 apartamentos e, no térreo, lojas comerciais, onde funciona, dentre outros, o bar do primeiro réu. Alegaram que o barulho gerado pelo estabelecimento, que ocupa área pública além do permitido, perturbando-lhes o sossego.

Disseram que várias foram as medidas judiciais e ocorrências policiais adotadas na tentativa de solucionar o problema, sem que houvesse êxito e que em razão da constante perturbação toda a família passou a desenvolver doenças de fundo emocional e em razão da falta do devido descanso noturno, em decorrência dos ruídos excessivos vindos daquele estabelecimento comercial. Pediram, assim, a condenação dos réus no pagamento de indenização a título de dano moral, no valor de R$ 70.000,00. Pediram, também, a gratuidade de justiça.

Instruíram a inicial com os documentos de fls. 29/201.

Os réus contestaram, alegando que o bar tem alvará com autorização de funcionamento até 2:00h da manhã, salientando que o local em que está situado é um dos mais movimentados da cidade, durante as 24 horas do dia e que nas proximidades há outros bares que funcionam até mais tarde. Argumentaram terem sido feitos laudos técnicos de aferição do barulho, que revelaram ser esse resultante de vários elementos e que os autores, quando adquiriram o seu imóvel, já estavam cientes da existência dos bares existentes na região.

Insurgiu-se contra a alegada vinculação de doenças desenvolvidas pelos autores e seus filhos com o funcionamento do bar e disseram não terem dado causa a qualquer dano por aqueles alegados, ressaltando o valor excessivo da indenização pretendida. Requereram, ao final, a improcedência do pedido inicial.

Juntaram os documentos de fls. 241/290.

Em réplica os autores reiteraram os fundamentos da peça preambular.

Facultada a especificação de provas, ambas as partes manifestaram interesse na produção da prova oral, tendo os autores, ainda, acostado aos autos os documentos de fls. 324/420.

O pedido de dilação probatória foi indeferido, nos termos da decisão de fls. 427/428.

É o relatório. Decido.

Não há questões preliminares, estando em ordem o processo.

Ressalte-se que a empresa individual não tem personalidade jurídica própria, confundindo-se com a pessoa do seu titular, que responde por todos os atos praticados. Por conseguinte, desnecessário o litisconsórcio passivo que, por outro lado, não enseja qualquer nulidade.

No mérito, a questão versada nos autos diz respeito à violação do sossego dos autores, em razão dos ruídos causados por e estabelecimento comercial dos réus e do dano moral sofrido em razão do fato.


Restou esclarecido pela prova documental dos autos que o bar dos réus ocupa, além das lojas, parte de área pública, pois mantém meses e cadeiras espalhadas na calçada, onde sua clientela é atendida, o que gera barulho muito alto em decibéis, em razão do chamado "burburinho", fls. 380/381. Ressalte-se que essa ocupação de área pública é irregular e que os réus não comprovaram estarem autorizados a fazê-lo, fl. 137.

Por outro lado, há, também, no bar reprodução de som mecânico (aparelhos de televisão e de áudio), atividade sonora potencialmente poluidora e para a qual o estabelecimento também não tem autorização e tratamento acústico adequado, fls. 380/381. Nesse sentido, não obstante autuado em 6 de janeiro de 2009, para regularizar suas instalações e adequação do bar às exigências da Lei Distrital 4.092/2008, fl. 387.

Observe-se, por outro lado, que o bar tem alvará para funcionamento até as 2 horas da manhã, horário regularmente ultrapassado, tendo em conta os abaixo-assinados de fls. 130/132 e 193/194, o que também foi constatado pela fiscalização do GDF, que assinalou "o abuso no que se refere ao horário de funcionamento, pois às 2:20 horas o bar estava lotado e com música mecânica", bem como a ausência de cuidado no recolhimento das mesas e cadeiras, provocando barulho, quando do encerramento da atividade, fl. 136.

Note-se que os documentos supramencionados são contemporâneos à época da propositura da ação, não tendo os réus comprovado terem regularizado as questões relativas à ocupação da área pública e reprodução de som mecânico, ônus que lhe incumbia, nos termos do art. 333, II do Código de Processo Civil. A propósito, a prova em questão deveria ser documental, não tendo os réus manifestado interesse nesse sentido.

Outrossim, esse contexto fático já existia nos idos de 2001, quando foi realizado exame do local por peritos do Instituto de Criminalística da Polícia Civil do Distrito Federal, cujo laudo está acostado às fls. 139/144, que tendo por objeto o apartamento daquele endereço e fonte principal de ruídos o bar dos réus.

Com efeito, consta do referido laudo que situações inerentes ao bar, que mantém mesas e cadeiras posicionadas em área pública, local de conversa dos fregueses, aliado ao som mecânico reproduzido pelo estabelecimento provocava ruídos, no período noturno, compreendido entre 20h e 6h, que superavam os limites máximos de decibéis admitidos pelas normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas.

Foi, ainda, assinalado pelos peritos que não obstante não fosse possível realizar a medição do nível de ruído emitido por cada fonte existente no local e proximidades, foi possível identificar "a origem dos ruídos e verificar que o nível de intensidade sonora dos ruídos emitidos pela Adega da Cachaça, notadamente a conversa de seus frequentadores, eram mais constantes e em níveis superiores aos das outras fontes.", fl. 143.


A conduta dos réus, ao ocuparem área pública e procederem à reprodução de som mecânico sem autorização e condições acústicas apropriadas, provocando ruídos que superam os limites aceitáveis, conforme assinalado no laudo da ICC/PCDF, bem como ultrapassarem o horário de funcionamento definido no alvará, constitui ato ilícito e, portanto, hábil a ensejar a reparação de danos, nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil.

O dano moral, cuja reparação é buscada pelos autores, diz respeito à violação dos direitos inerentes e essenciais ao ser humano, isto é, dos direitos ditos existenciais, como aqueles relativos à personalidade humana, decorrentes do respeito à pessoa e sua dignidade. Seu objeto abrange, assim, bens jurídicos concernentes à liberdade, intimidade, vida privada e à integridade psicofísica, que diz com o direito a não sofrer violações em seu corpo e aspectos de sua personalidade.

No caso, a situação criada pelos réus, com a produção de ruídos reiterados e intermitentes, em nível elevado, atingindo o recesso do lar dos autores, tira-lhes o sossego e o direito à paz e tranqüilidade no âmbito residencial, em especial no horário noturno, destinado ao descanso, viola esses aspectos de sua personalidade. De fato, noites mal dormidas resultam em queda na qualidade de vida, com prejuízos nas relações sociais e profissionais, atividades intelectuais e inclusive na própria aparência física.

Evidencia-se, pois, que a conduta dos réus implica nítida turbação à vida dos autores e sua intimidade, sendo que, segundo leciona Maria Celina Bodin de Moraes, "circunstâncias que atinjam a pessoa e sua condição humana, que neguem essa sua qualidade, serão automaticamente consideradas violadoras de sua personalidade e, se concretizadas, causadoras de dano moral a ser reparado" ("in" Danos à pessoa humana: uma leitura civil constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p.327).

Configurado, pois, o dano moral, fruto de situação grave criada pelos réus e suficiente para afetar a dignidade dos autores, a indenização é medida que se impõe. Não há na lei critérios objetivos que orientem a fixação do "quantum" reparatório. No entanto, deve-se ter em mente que esta reparação não tem por finalidade estabelecer o chamado "pretium doloris", tampouco o valor para a honra do ofendido, mas sim de proporcionar-lhe uma satisfação de qualquer espécie que, sob o aspecto material, represente uma soma em dinheiro capaz de amenizar a amargura da ofensa, sem se esquecer do seu caráter punitivo e pedagógico, no sentido de desestimular a reiteração de práticas análogas.

Sob esse enfoque, afigura-se o que a importância de R$ 32.000,00 (trinta e dois mil reais), é razoável e cumpre tal finalidade. O valor da condenação deverá ser corrigido monetariamente com base no INPC, a partir desta data, a fim de preserva-lhe a expressão monetária, e acrescido de juros de mora, devidos desde a citação, 13 de janeiro de 2009, fl. 207, nos termos dos arts. 219 do Código de Processo Civil e 405 do Código Civil, à taxa legal de 1% (um por cento) ao mês, conforme art. 406 do Código Civil c/c art. 161, §1º do Código Tributário Nacional.


Ante o exposto, julgo procedente o pedido para condenar os réus a pagarem aos autores indenização a título de dano moral no valor de R$ 32.000,00 (trinta e dois mil reais), corrigidos monetariamente, com base no INPC, a partir da data dessa sentença e acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, devidos desde 13 de janeiro de 2009, cabendo a cada um dos autores o equivalente a 50% (cinqüenta por cento) dessa importância.

Extingo o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 269, I do Código de Processo Civil.

Condeno os réus, ainda, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, de acordo com o art. 20, §3º do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se, cientes os réus de que, nos termos do art. 475-J, do Código de Processo Civil, o não pagamento do valor da condenação no prazo de até 15 dias, contados do trânsito em julgado dessa sentença, resultará na incidência da multa de 10%, prevista no citado dispositivo legal.

Taguatinga - DF, terça-feira, 02/03/2010.

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